Nos últimos dez anos, o setor bancário brasileiro passou por uma transformação impulsionada pela ascensão das fintechs e pela digitalização dos serviços financeiros. Um estudo realizado pela CVA Solutions, com 3.688 consumidores de todas as regiões do país, revelou que o índice médio de satisfação dos clientes com os bancos, medido pelo Net Promoter Score (NPS), saltou de 14% para 67% entre 2014 e 2024.
A pesquisa é parte da nona edição do levantamento feito pela consultoria, que avalia aspectos como força da marca, valor percebido, uso de canais digitais e a relação dos consumidores com produtos financeiros como conta corrente, cartão de crédito, investimentos e seguros. Os dados apontam um cenário de maior competição, no qual as instituições tradicionais buscam recuperar a preferência dos clientes frente às fintechs que ganharam espaço oferecendo serviços simples, digitais e gratuitos.
Segundo Sandro Cimatti, sócio-diretor da CVA Solutions, a melhoria no NPS reflete a resposta dos bancos ao novo contexto competitivo. “O crescimento do NPS se deve ao aumento da concorrência, especialmente o Nubank que já iniciou com NPS acima de 70%”, afirmou. Para ele, a popularização do acesso digital também teve papel importante no processo de melhoria dos serviços oferecidos. “O aumento da digitalização dos clientes também estimulou a melhoria dos processos, jornada dos clientes e desenvolvimento de aplicativos”, explicou Cimatti.
O levantamento identificou uma ampla adoção de canais digitais por parte dos consumidores. Aplicativos de celular se consolidaram como o principal meio de atendimento, sendo utilizados por 97% dos entrevistados. Além disso, 94% afirmaram utilizar o PIX como principal forma de pagamento, o que contribui para a queda na procura por agências físicas e caixas eletrônicos.
Cimatti destacou a nova lógica de atendimento e transações no setor. “Os aplicativos são o principal canal de atendimento atualmente. O PIX é o principal meio de pagamento. Com isto, perderam relevância: as agências, os caixas eletrônicos, o dinheiro físico e outros meios de pagamento”, afirmou.
A facilidade proporcionada pelos meios digitais também ajudou a consolidar o protagonismo do Nubank no mercado. Fundado em 2017 como banco digital, o Nubank lidera hoje em força da marca e principalidade entre os clientes, desbancando os grandes bancos tradicionais. Em 2019, apenas 3,8% dos entrevistados declaravam ter o Nubank como seu banco principal; hoje, esse número já é de 19,6%.
Cimatti relaciona o crescimento do banco digital a uma combinação de fatores. “Gratuidade dos serviços, tecnologia, boa jornada dos clientes e bom atendimento humano ajudaram o crescimento do Nubank”, afirmou.
O avanço das fintechs levou bancos como Itaú, Bradesco e Santander a revisarem suas estratégias. A resposta incluiu investimentos em tecnologia, revisão de tarifas e melhorias no atendimento. No caso do Itaú, por exemplo, o banco que chegou a perder espaço no mercado conseguiu recuperar parte da sua força e preferência dos consumidores, registrando NPS de 70% em 2025.
“Os grandes bancos aumentaram a digitalização, aperfeiçoaram a jornada dos clientes, tornaram suas tarifas mais competitivas e lançaram bons aplicativos”, avaliou Cimatti.
Apesar da crescente concorrência, os bancos tradicionais mantêm vantagem em algumas áreas, especialmente pela conta salário, ainda considerada estratégica para fidelizar clientes. Segundo Cimatti, a principalidade — ou seja, o banco que o cliente elege como principal — segue mais forte nas instituições que oferecem esse tipo de vínculo. “A conta salário é relevante pois fideliza o cliente, ajuda no uso dos demais produtos e contribui para a principalidade dos clientes”, observou.
O estudo também mostrou que os consumidores brasileiros passaram a utilizar mais de uma conta bancária. Em média, cada pessoa tem hoje 3,4 contas, ante 1,9 em 2019. Mesmo assim, há uma clara distinção entre a conta principal — mais usada — e as demais. “Os clientes usam bastante a conta principal e usam pouco as demais contas”, explicou o executivo.
Embora as fintechs tenham conquistado espaço nas contas e serviços bancários, sua presença no mercado de seguros ainda é limitada. Os dados mostram que bancos e seguradoras tradicionais mantêm domínio neste segmento, em parte devido à complexidade dos produtos e à necessidade de orientação especializada no momento da contratação.
“S seguros e Previdência são produtos mais complexos de serem explicados e os corretores são muito importantes na venda, tornando a participação das fintechs menos relevante nestes produtos”, afirmou Cimatti. Para ele, a rentabilidade das instituições no cenário atual depende da venda cruzada de produtos — o chamado cross sell. “A rentabilidade virá do uso intenso (principalidade) de todos os produtos do portfólio”, complementou.
Outro ponto de atenção levantado pelo estudo foi a diferença na qualidade dos serviços entre contas pessoa física e pessoa jurídica. Há uma percepção de que o atendimento voltado a pequenos empreendedores e empresas é inferior ao oferecido aos clientes individuais de alta renda. “Os dados revelam que existe um segmento de pessoas que são premium em sua conta corrente pessoal mas que em suas pequenas empresas próprias têm um atendimento muito pior”, disse Cimatti. Para ele, integrar as duas experiências é uma oportunidade de melhoria.
O levantamento também investigou o que os clientes esperam das instituições financeiras no médio e longo prazo. Há uma demanda crescente por personalização, inteligência na oferta de serviços e integração entre canais e produtos. A expectativa é que a tecnologia — especialmente a inteligência artificial — permita uma relação mais próxima e assertiva com o consumidor.
Cimatti explica que os bancos devem evitar oferecer produtos inadequados ou desnecessários, atuando de forma preventiva e personalizada. “Espera-se que a comunicação, assessoria e transacional sejam mais integrados e personalizados”, destacou. Segundo ele, isso inclui ações como evitar que o cliente entre no rotativo do cartão de crédito se possui recursos aplicados ou oferecer produtos com vantagens reais baseadas no perfil de consumo de cada um.
O estudo da CVA Solutions, que também mede o valor percebido (custo-benefício na visão do consumidor) e a força da marca (atração menos rejeição), destaca a competitividade crescente entre os mais de 20 bancos e fintechs analisados, além de seguradoras. O Nubank aparece como líder em força da marca, seguido por Itaú, Banco do Brasil e Banco Inter. No quesito valor percebido, o BTG Pactual lidera, e o Bradesco Prime encabeça o ranking de NPS dos clientes.
A tendência, segundo o levantamento, é de que os consumidores sigam migrando para experiências digitais cada vez mais integradas, o que exigirá das instituições capacidade de adaptação e inovação contínua. Como resumiu Cimatti, o futuro da relação entre bancos e clientes está na junção entre boa experiência, custo competitivo e uso inteligente da tecnologia.
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